Hoje eu vou falar sobre a técnica que mora no meu coração. Sim, esse prof aqui é sentimental. Eu vou te contar o que a Estimulação Magnética Transcraniana faz.
A Estimulação Magnética Transcraniana, que podemos chamar de EMT ou TMS, é um equipamento que foi desenvolvido no ano de 1985 por um físico chamado Anthony Baker no Reino Unido.
E a ideia na época era utilizá-la em pesquisas científicas utilizando-a para medidas de neurofisiologia, porque até então não era possível realizar estas medidas com o paciente acordado.
E aí, lá nos anos 90, Alvaro-Pascual Leone e Mark George, investigando as medidas neurofisiológicas de pacientes com depressão, perceberam que os pacientes mudavam seus estados de humor durante essas investigações com a TMS.
E isso fez com que ela começasse a ser pesquisada e utilizada para tratamento.
A Estimulação Magnética Transcraniana é um tipo de Neuromodulação não-invasiva e é utilizada para modular o tecido neuronal, e pode ser realizada em estruturas centrais, como o córtex,o cerebelo e a medula ou em estruturas periféricas como, nervos cranianos e o nervo frênico, por exemplo.
E como eu já contei para vocês, ela é aprovada por órgãos reguladores como o FDA e pela ANVISA.
A TMS consiste de um equipamento chamado capacitor onde se conecta uma bobina.
Essa bobina é o item que pode ser variado no equipamento e é ele que vai ser encostado na cabeça do pacientes para induzir o campo magnético no cérebro dele.
Além de termos diversos modelos de bobinas, nós temos diversos parâmetros no equipamento.
Os parâmetros são as “regulagens” que podemos pôr nesse equipamento de TMS.
E por fim, mas não menos importante a outra variante que temos nessa equação é o local do sistema nervoso em que o estímulo será aplicado. Esse local é comumente chamado de alvo.
A bobina, os parâmetros e o alvo juntos formam um protocolo de tratamento.
Cada diagnóstico tem protocolos de tratamentos já bem estabelecidos ou outros ainda em pesquisa.
A escolha do primeiro item, a bobina, dependerá da aplicabilidade na sua clínica do dia a dia. E eu oriento individualmente meus alunos do Curso Online de Neuromodulação quando eles decidem adquirir esse equipamento. Pois essa escolha dependerá das especialidades que atenderão e também da verba disponível para isso.
Estudos investigando o mecanismo exato do funcionamento da EMT demonstraram que uma corrente elétrica é induzida no cérebro do paciente, essa corrente elétrica é capaz de gerar um campo magnético com carga por volta de 1,5-2T, que apresentam um volume cilíndrico, com um raio aproximado de ≈1cm e altura ≈2cm, e isso vai diminuindo ao longo do eixo central do neurônio.
Esse campo magnético ativa o neurônio, e faz o impulso elétrico viajar pelo corpo do neurônio e chegar ao axônio, onde dispara a liberação de neurotransmissores na fenda sináptica.
Dentre os neurotransmissores envolvidos nessa equação estão predominantemente o Glutamato que leva a uma excitação do sistema e o GABA que faz inibição das vias nervosas.
Então com o uso da EMT, você tem a possibilidade de modular o funcionamento de áreas do sistema nervoso do doente.
E por que isso é interessante?
Por que você conseguirá atuar DIRETAMENTE no cérebro do seu paciente. Sabendo o que está chegando, onde está chegando e o quanto disso está chegando.
Na técnica de Estimulação Magnética Transcraniana, a parte que é posicionada na cabeça do paciente se chama bobina. Há diversos tipos de bobinas, elas variam de acordo com o modelo e marca do aparelho. Cada modelo de bobina foi idealizado para atingir uma profundidade específica do cérebro e uma extensão específica.
E isso torna esse tratamento MUITO especial.
Por que?
PORQUE ele é PRECISO!
Enquanto na ETCC ou TDCS, nós utilizamos da corrente elétrica de baixa intensidade passando por áreas do cérebro, na EMT você consegue gerar um campo magnético em uma área específica do cérebro do paciente, ele é focal, quase do tamanho de uma moeda.
E como o tratamento com a Estimulação Magnética Transcraniana é realizado?
Bom, com o paciente acordado, ai na sua clínica, no seu consultório, de preferência sentado ou deitado, você irá posicionar a bobina no local específico da cabeça correspondente à área do cérebro que irá ser tratada.
Essa área vai ser escolhida de acordo com o que temos de maior evidência para a doença ou condição que o paciente possui.
Ao encostarmos a bobina de EMT na cabeça do paciente e apertamos o botão, disparamos a energia armazenada no equipamento. Essa liberação de energia é chamada de pulso.
Então pulso é a unidade de medida da EMT. É a variação elétrica que produz o campo eletromagnético.
Esse pulso pode ser simples ou de repetição.
Chamamos de pulso simples, aquele quando o estímulo é dado uma única vez e quando ele é dado repetidas vezes chamamos de pulso de repetição.
O pulso simples tem efeito biológico, mas geralmente esse efeito é momentâneo e de curta duração. Ele foi muito utilizado para os estudos de neurofisiologia das vias motoras por conseguir mimetizar efeitos fisiológicos (por exemplo, contração muscular) ou tem a capacidade de interferir em mecanismos fisiológicos (por exemplo, facilitam ou inibem a contração voluntária).
É legal você entender também que existem regiões onde os efeitos da estimulação são facilmente mensuráveis que em outros, por exemplo, o córtex visual é facilmente estudado com pulso simples e nele possível de produzir fosfenas nele.
Outra região que também pode ser estudada com pulso simples é o córtex sensitivo, mas é difícil que um pulso simples produza algum efeito observável, como formigamento. O mais comum são estudos de interferência na função sensitiva, especialmente na função tátil.
Já na região temporal, parietal e frontal, os pulsos simples não costumam produzir efeitos observáveis ou mensuráveis sem a utilização de técnicas sofisticadas como ressonância magnética funcional ou pet scan.
Os pulsos de repetição tendem a induzir efeitos biológicos mais duradouros e eles são os utilizados para as terapêuticas, ou seja para os tratamentos.
Lembra que eu te contei que TMS é a sigla em inglês para a EMT?
Pois bem, quando você for estudar um artigo que propõe um tratamento com TMS, você observará que a sigla utilizada é rTMS. Isso significa que são pulsos repetitivos.
Para cada protocolo de TMS repetitiva escolhe-se um número de pulsos e esse é o primeiro parâmetro.
Por exemplo, em uma sessão para tratamento da dor essa quantidade é de 3.000 pulsos.
O segundo parâmetro é chamado de SÉRIE.
A SÉRIE são os “blocos de pulso” entregues ao sistema nervoso do paciente durante uma sessão de estimulação. Na depressão, por exemplo você pode fazer 50 séries.
Depois disso, nosso terceiro parâmetro é o INTERVALO ENTRE AS SÉRIES.
Durante a aplicação da TMS, há o momento de entrega das séries e sempre há um intervalo entre elas. Esse intervalo faz-se necessário para a segurança do paciente, recomenda-se no mínimo 20 segundos de intervalo. Que é o tempo necessário para que o neurônio se repolarize.
O quarto parâmetro é a FREQUÊNCIA, que consiste no número de pulsos por segundo aplicados ao sistema nervoso do indivíduo. É a frequência que determinará se um estímulo terá efeito “excitatório” ou “inibitório”. Ou seja, se vamos estimular a via ou vamos “acalma-la”.
10 hertz quer dizer que estamos fazendo 10 pulsos/segundo e isso é uma frequência excitariatória. Enquanto 1 Htz, eu faço 1 pulso/segundo e é um frequência inibitória.
O quinto parâmetro é a INTENSIDADE.
O campo magnético apresenta uma queda exponencial de intensidade com a distância. Por isso, quanto mais próximo a superfície da bobina, maior a intensidade da estimulação e o efeito no tecido.
A medida da intensidade é em Tesla. Que seria algo como a quantidade de corrente que passa pela bobina por unidade de tempo. Mas cada aparelho comercialmente disponível, tem uma intensidade de corrente máxima própria, que vem descrita no seu manual e deve ser conhecida pelo operador.
Os aparelhos oferecem uma medida em porcentagem da potência máxima, que é o valor que utilizamos para estimular. O valor da porcentagem do aparelho vai de 0 a 100.
E a intensidade escolhida para a estimulação é individual, varia de paciente para paciente e diagnóstico para diagnóstico.
Então, esses são os cinco ajustes que podem variar no equipamento de EMT.
Além de decidir e estudar esses cinco ajustes ou parâmetros, também se estuda e decide o alvo onde o doente será estimulado. Que basicamente é o local onde a bobina será posicionada para a realização da do tratamento com EMT. Ele muda de doença para doença ou de protocolo para protocolo.
Hoje sabemos que a EMT tem seu principal efeito sobre algumas regiões do cérebro em especial: como o córtex cerebral, principalmente as regiões mais superficiais.
Para estudos de neurofisiologia os alvos mais utilizados são o córtex motor, córtex visual e córtex sensitivo. Já para o tratamento, o córtex motor, córtex pré-frontal dorsolateral, córtex temporoparietal, área motora suplementar, são as áreas superficiais de escolha.
Estruturas mais profundas do cérebro também podem ser atingidas e têm sido utilizadas para o tratamento. Sendo elas o cerebelo, ínsula, giro anterior do cíngulo, porém os alvos mais estudados e estimulados são o córtex motor e o córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo.
E por fim, mas não menos importante temos que decidir o número de vezes que esse paciente será estimulado. Sim, esse tratamento é feito em sessões e a quantidade de sessões varia de acordo com o quadro do paciente.
Isso também é baseado na literatura.
“Ta Ricardo, isso aí tem evidências de que funciona?“
Esse tratamento funciona mesmo?
Lembra que eu te disse que a EMT surgiu dentro do âmbito da pesquisa?
Sim, então muito ANTES do seu uso no dia a dia clínico ela foi amplamente PESQUISADA!
Ela não é um tratamento como vemos muitos por ai, que alguém resolveu aplicar para tudo e tenta fazer ele se passar por um tratamento com evidências.
O caminho que ela percorreu para chegar até aí no seu consultório foi o caminho considerado certo na ciência.
Primeiro seus efeitos foram pesquisados.
Depois sua segurança foi EXTENSAMENTE pesquisada.
Depois melhorias foram feitas e pesquisadas.
E por fim, ela foi e ainda é extremamente pesquisada em diversas doenças, em diversas condições.
Algumas delas há décadas, como é o caso do seu uso em quadros de depressão e outras foram pesquisadas bem mais recentemente, como é o caso das afasias.
Eu sei que você está ansioso, ansiosa para que eu te conte todas essas indicações.
Então vamos lá!
Agora que você já entende o princípio do efeito da TMS, já sabe que para cada doença tem um ou mais protocolos estabelecidos, já sabe que os parâmetros possuem regulagens e são elas que variam de paciente para paciente.
Chegou a hora de te contar para quais casos você vai conseguir indicar e aplicar na sua clínica.
Pelo fato da estimulação magnética transcraniana ser pesquisada há décadas, nós temos MUITOS estudos científicos que apoiam o uso da técnica nas mais variadas doenças.
A revisão, avaliação, compilação desses estudos e da sua qualidade nos permitiriam que hoje nós tenhamos guidelines para o seu uso.
E o que são guidelines?
Guidelines são guias, são norteadores da eficácia de um tratamento para uma doença.
Nos guidelines atuais sobre a Estimulação Magnética Transcraniana nos diz que o uso desse tratamento tem nível de evidência.
Gente deixa eu lhes explicar uma coisa, quando falamos em nível de evidência, em certa maneira estamos dizendo que há uma quantidade de pesquisas e estudos científicos relacionados um tratamento frente para uma doença ou tratamento. E inclusive julga a qualidade e o tipo de pesquisa que foi feita. Sendo assim, o nível de evidência pode ser A, B ou C.
Quando eu falo que um nível de evidência é Nível C, que dizer que há um possível efeito benéfico e com pouco ou nenhum efeito adverso.
Você precisa entender que FORAM realizadas poucas pesquisas do tipo ensaios clínicos, ou seja, um trabalho que tenha um grupo placebo que foi comparado com um grupo que recebeu o tratamento real.
O que isso significa?
Isso apenas quer dizer que aquela doença foi pouco pesquisada com aquele tipo de tratamento.
Para EMT, por exemplo, temos nível de evidência C em quadros como a síndrome complexa de dor regional, cefaléia, TOC, espasticidade heminegligente, epilepsia, Doença de Alzheimer, Zumbido, Estresse pós-traumático, alucinação auditiva da Esquizofrenia, adicção e fissura.
E daí quando eu falo que alguma doença tem nível de evidência B, quer dizer que há recomendação baseada em evidências de um único ensaio clínico randomizado ou de vários estudos não randomizados.
No caso da TMS, ela é nível B para uso nos sintomas depressivos de pacientes com Parkinson, nos sintomas negativos da esquizofrenia, bem como afasia pós-AVC, esclerose múltipla
E por fim, o nível de evidência há nos diz que nível de evidência A. recomendação do uso foi baseada em evidências de múltiplos ensaios clínicos randomizados ou metanálises.
Assim, a EMT é nível A de evidência para depressão, dores crônicas, fibromialgia e na reabilitação pós-AVC.
Esses níveis de evidência mudam, de acordo com as pesquisas e resultados obtidos. Cada vez mais doenças hoje tem nível de evidência e isso só tende a crescer.
Os níveis de evidências na verdade são recomendações de uso baseadas nas pesquisas existentes.
E a beleza da Estimulação magnética transcraniana é que seu uso pode ser pensado, racionalizado, pesquisado a depender da alteração que existe no sistema nervoso do paciente e do que você pode fazer atuando no cérebro dele.
Veja só:
Na dor crônica ou neuropática, a TMS atua liberando opióide endógeno e auxiliando a diminuir a sensibilização central. Nos quadros de fibromialgia,em específico, além de melhorar a dor, auxilia na melhora dos efeitos de humor deprimido, rigidez matinal e a desatenção causada pela doença. E o equilíbrio do GABA nos pacientes de fibromialgia leva também à melhora do sono.
Na depressão, temos a teoria de que o hemisfério esquerdo do cérebro está hipoativo e o hemisfério direito está hiperativado. Diante disto, há uma disfunção entre os lados. Assim, na depressão o uso da TMS é sempre excitatória no hipoativado e no lado hiperativado é inibitório.
É esperado que quando iniciada a estimulação magnética transcraniana junto da medicação para depressão ocorra uma potencialização dos efeitos medicamentosos.
Fora isso, nos casos onde os pacientes não toleram os antidepressivos e também nos casos onde os pacientes não querem tomar medicamentos, a TMS é de grande valia.
Já quando pensamos na fisiopatologia do AVC sabemos que o lado afetado ou o lado doente do cérebro está hipoativado e o lado normal hiperativado. Então ao realizarmos tratamento com a TMS, temos duas possibilidades: a primeira é excitar o lado lesado e a segunda é inibir o lado sadio.
Independente da escolha ou do racional adotado, o que percebemos é a melhora da excitabilidade cortical do cérebro, ou seja, do funcionamento cerebral deste paciente levando à recuperação de quadros como a hemiparesia, disfagia e afasia que ele pode apresentar.
E se você atende pacientes que apresentam quadros de distúrbios de de movimento como:
-parkinson
-distonia
-ataxia
A Neuromodulação modifica o quadro destas doenças, minimizando os descompassos de equilíbrio, tremor e de marcha.
Tá ricardo, mas me conta assim:
QUANTO O PACIENTE MELHORA?
Como qualquer tratamento na área da saúde, o resultado é variado, não há REGRAS!
Mas dizemos que o paciente respondeu bem ao tratamento quando ele tem uma melhora entre 30-50% em relação a sua avaliação basal.
O que a Neuromodulação não-invasiva te trará é algo que NENHUM tratamento que você faz em âmbito clínico faz!
Ela atua DE VERDADE e chega COM CERTEZA ao cérebro do seu paciente.
Além disso, ela tem mecanismo de ação que nenhum tratamento que você faz hoje na sua clínica terá!
E vai preencher esse buraco, esse GAP nos tratamentos que existem.
4 respostas
Olá boa tarde, sou fisioterapeuta. Gostaria de tratar dores crônicas e pessoas do espectro autista TEA. Qual aparelho teria que adquirir para fazer esses tratamentos, qual o valor de um aparelho pra isso?
Pode me informar? Pq gostaria de fazer o curso, mas se puder comprar o aparelho. Agradeço a atenção
Olá dra Raquel, tudo bem?
Um equipamento de TDCS nacional começa em 4 mil reais.
Boa noite, a minha esposa vai começar um tratamento no dia 15-05-2023 aqui em Novo Hamburgo RS e promento que vor dar retorno se foi bom ou ruim.
que legal sr João! Nos conte depois como ela evoluiu!